Guia: Segurança de Alimentos e Coronavírus

Informações sobre a COVID-19, a sua relação com alimentos e o que podemos fazer. A primera: muita calma nessa hora, tá?

Homem com luva azul colocando molho sobre alimento
Foto: Allie Smith via Unsplash

A intenção deste texto é esclarecer alguns pontos sobre este surto de 2020 do Coronavírus e como ele pode ou não influenciar a nossa segurança alimentar.

Como de costume: sempre baseado em fatos e evidências de fontes confiáveis, e claro, as referências estão no final do artigo.

O que é Coronavírus, SARS-CoV-2, COVID-19?

Vamos por partes! Cada nome signifca uma coisa:

  • Coronavírus: é um grupo de vírus que causam doenças em humanos e aves. Em seres humanos causa infecções no trato respiratório.
  • SARS-CoV-2: é o nome oficial do vírus, sendo a sigla para Severe acute respiratory syndrome coronavirus 2 (síndrome respiratória aguda grave do coronavirus 2) que causa uma doença.
  • COVID-19: é o nome oficial da doença causada pelo vírus SARS-CoV-2, sendo a sigla para Coronavirus disease 2019.

Apesar do SARS-CoV-2 ser um vírus novo, ele possui similaridades com outros coronvarius como SARS-CoV-1 (este foi o responsável perto surto de SARS em 2002) e MERS.

Como se pega a COVID-19?

É uma infecção causada pelo vírus SARS-CoV-2 no trato respiratório e a principal forma de contágio é entre pessoas via gotículas de saliva e/ou muco de pessoas infectadas ao espirrar ou tossir dispersas no ar.

Os primeiros dados sobre a doença, o Centers for Disease Control and Prevention (CDC) indica que a principal forma de propagação do vírus é com aglomeração de pessoas, caso alguma (ou várias) esteja infectada.

Por isso em diversos lugares do mundo foram cancelados eventos e sendo proibidos para evitar ter muitas pessoas em um mesmo lugar. Assim, nós conseguimos limitar a disseminação do vírus.

E por que isso é imporante? Com essas medidas, nós conseguimos oferecer proteção para aqueles que são mais vulneráveis à doença: idosos, pacientes com doenças crônicas severas, imunocomprometidos seja por tratamento de doença ou devido a medicamentos. Geralmente, esta forma de proteção é dada via vacina, mas como o vírus é novo, ela não existe ainda.

Existe outra maneira de contrair o vírus?

Segundo o German Federal Institute for Risk Assessment (BfR), não existe nenhum caso com evidências que a doença foi decorrente a contato de alimentos ou artigos contaminados com o vírus.

Porém, o instituto alemão indica que uma transmissão via superfície recentemente contaminada seria possível, mas improvável. Para tal, a pessoa teria que enconstar na superfície, então, tocar no olho ou nariz dentro de um curto período de tempo devido a baixa estabilidade do vírus ao ambiente.

O Centers for Disease Control and Prevention (CDC) informa que até o momento não registrou contaminação via fecal-oral. O real risco de uma contaminação via as fezes de uma pessoa contaminada ainda não são conhecidos, porém é esperado que o risco seja mínimo quando comparado com outros tipos de coronavírus.

Também segundo o órgão americano, o vírus não foi detectado em água de consumo. E o sistema de saneamento e tratamento de água deve remover ou inativar o vírus.

Por quanto tempo o vírus permanece nos alimentos?

As informações se vírus fica ativo em alimentos ainda são limitadas. O que se sabe é: o vírus é mais estável em superfícies sem porosidade e inorgânicas (como metal e plástico), e perde a estabilidade mais rápido em orgânicas como papelão. O tempo de permanência depende também de fatores como temperatura, umidade e luz.

É possível contrair a COVID-19 por alimentos?

Corredor de mercado
Foto: Mehrad Vosoughi via Unsplash

Segundo as principais entidades de saúde e segurança no mundo, Centers for Disease Control and Prevention (CDC), U.S. Department Of Agriculture (USDA), European Food Safety Authority (EFSA), não há evidências que seja possível contrair a doença via alimentos ou pelas embalagens.

Isso foi comparado com outros surtos de coronavírus similares (SARS-CoV e MERS-CoV) e não foi visto esta ocorrência, segundo a World Health Organization (WHO).

É certeza absoluta que alimentos não transmitem a COVID-19?

Não, certeza absoluta não. Um vez que as informações sobre isso ainda são bem limitadas. Porém, o estudo de doenças propagadas por alimentos é conhecida e estudada, e até o momento a COVID-19 não se encaixa no padrão delas.

Um exemplo dado pelo J. Kenji López-Alt do Serious Eats: se um cozinheiro tossir ou espirrar sobre a comida (sim, seria bem nojento), como eu não vou contrair o vírus e ter COVID-19?

O risco de desenvolver a doença é mínimo, uma vez que a rota de entrada foi pelo sistema digestório. E por ser um vírus do trato respiratório precisa do sistema respiratório para conseguir se multiplicar como indica o artigo Transmission routes of respiratory viruses among humans de 2018.

Outro cenário que você pode estar pensando, se ao invés de tossir e espirrar diretamente na comida, for nos utensílios de preparo como uma tábua e ela encostar no alimento. E por fim, você comer com as mãos?

Kenji indica que teria uma série de diluições da carga viral (a quantidade de vírus presente). Passaria da tábua para o alimento, do alimento para a embalagem, do alimento para as suas mãos, e for fim das suas mãos para o rosto. O especialista em segurança alimentar que ele consultou (Ben Chapman) não descarta a possibilidade, mas a chance seria pequena como um “tiro na lua”.

Mas lembre: usar talheres e guardanapo limpos e lavar as mãos antes de comer é sempre bem-vindo.

Existe algum risco associado aos alimentos?

Pelo o que nós sabemos até o momento, não. Se falarmos de alimentos comprados em restaurantes e afins é esperado que os estabelecimentos sigam as Boas Práticas de Manipulação e Higiene que a ANVISA regulamenta. Estas Práticas devem ser seguidas sempre, não apenas agora e em casa também!

Existe até a Cartilha sobre Boas Práticas para Serviços de Alimentação baseada na Resolução RDC 216/2004Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação.

Higienização e Sanitização de Alimentos em Casa

Uvas escuras sendo lavadas
Foto: Manki Kim via Unsplash

Em casa, o processo continua o mesmo já bem comum e conhecida higienização e sanitização de alimentos. Também está disponível na cartilha da ANVISA Vamos lembrar?

  1. Lavar em água corrente os hortifrutis um por um (legumes, folhas, frutas…) removendo as sujeiras grandes como: terra, pedras, insetos e afins.
  2. Colocar os hortifrutis de molho em solução de água clorada por 10 minutos, geralmente é usado água sanitária (hipoclorito de sódio). A diluição mais usada é 15mL de água sanitária 200ppm (1 colher de sopa) para 1 litro de água.
  3. Enxaguar os hortifrutis um por um em água corrente, e deixar escorrer.
  4. Usar na sequência ou manter na geladeira bem armazenado.

Um adendo quanto a água sanitária: leia o rótulo da sua. Geralmente, os fabricantes informam a diluição que deve ser usada para a sanitização de alimentos. E algumas não devem ser usadas. Então, preste atenção nisso.

Pedi comida pronta, reaquecer elimina o vírus?

Caixas de pizza vista por uma janela alta
Foto: Thomas Peham via Unsplash

Sim, se quiser fazer isso. Temperatura e tempo são fatores para deixar um alimento seguro para consumo quando falamos em eliminar bactérias, fungos e vírus. Isso vale para qualquer ocasião, não só agora. Mas lembrando: é esperado que o estabelecimento siga as Boas Práticas de Manipulação e Higiene.

Para o vírus específico da COVID-19 (SARS-CoV-2), os dados ainda são limitados. Mas estudos com vírus do mesmo grupo indicam a inativação via tratamento térmico a partir de 63ºC por 3 minutos. Ou seja, o alimento estando acima desta temperatura já seria suficiente.

Para alimentos sólidos, como peito de frango ou bife, é assumido que o vírus não penetrou no alimento. Caso esteja presente, será na superfície apenas. Então, aquecendo o exterior seria suficiente.

O esperado para o vírus é que ele se comporte como qualquer outro patógeno quanto a sua inativação durante o cozimento. Porém, dados mais precisos ainda são necessários para afirmar isso.

E se eu congelar, elimina o vírus?

De acordo com WHO no seu boletim 19 sobre a COVID-19: ainda estão sendo feitas pesquisas quanto a viabilidade e tempo de permanência do vírus.

De modo geral, coronavírus são muito estáveis quando congelados e podem resistir até 2 anos em temperaturas de -20°C. Apesar da evidência atual sobre outros tipos de coronavírus indicarem que sejam estáveis em baixas temperaturas e congelados por um certo período de tempo: seguir as Boas Práticas de Manipulação e Higiene podem prevenir uma possível transmissão via alimentos.

E como já vimos, o vírus é sensível ao calor. Então, se for cozido de modo correto, o risco é pequeno.

Lavem as mãos!

Lavando as mãos com sabonete
Foto: Pirate Cat via Unsplash

Um hábito que todo mundo deveria ter, não é mesmo? Higine básica! E você não precisa de um sabonete ou sabão especial. Não, você não precisa de um sabonete antibacteriano.

Primeiro que a COVID-19 é causada por um vírus e não uma bacteria. Segundo, o mecanismo como o sabonete age é o mesmo para todos os sabonetes e sabão.

O vírus é protegido por uma capa de gordura e proteínas. Sabonete e sabão são surfactante que conseguem quebrar-dissolve essa capa, e assim inativando o vírus.

Posso usar álcool gel?

Claro! Mas em algumas ocasiões.

Se você estiver em casa e/ou tiver acesso a uma pia com sabonete, lave as mãos. O álcool em gel é para os casos em que você não consegue lavar as mãos de imediato. Teve que sair de casa, por exemplo.

E sempre usar álcool gel 70% e nada fazer em casa. Tem cada receita errada sendo divulgada e mesmo que estivessem certas: se você não tem o treinamento, capacitação e nem acesso aos equipamento e reagentes adequados para tal, para que se aventurar nisso? Como já falei, lavar as mãos é o ideal.

O que você pode fazer?

  • Mantenha a calma, tá?
  • Lave as mãos de tempos em tempos. Saiu de casa? Leve álcool gel, se possível. Voltou? Lave as mãos.
  • Só saia de casa se necessário.
  • Não precisa comprar comida (e nem papel higiênico) no pânico, apenas o que realmente precisar.
  • Compre alimentos que possuem validade grande naturalmente como: grão secos, enlatados e congelados. Para não ter que ir toda hora no mercado.
  • Dê preferência ao pagamento sem contato (contactless) que alguns cartões e celulares oferecem.
  • Higienize as embalagens dos alimentos que são possíveis, coloque em outros recipientes antes de guardar na geladeira.
  • Antes de acreditar em mensagens vindas do Whatsapp, cheque a informação. Veio de alguma fonte confiável mesmo? Não é hora de divulgar notícias falsas, aliás, nunca é. Tem vidas em risco, lembre-se disso.
  • Tome conta de seus idosos e sim, agora é hora de falar para eles: não vai sair e não, você não é todo mundo.
  • Lave as mãos, por favor.

Referências

Vitor Hugo

Mestre em Ciência de Alimento, Farmacêutico-Bioquímico e Gastrônomo. Atua como Produtor Gastronômico e Comunicador de Ciência. Criou o PratoFundo para ser o portfólio de gastronomia e ciência.

Fez ou tem uma dúvida sobre a receita? Comente!

Por causa das mudanças de privacidade feitas na Comunidade Europeia, o seu comentário não irá aparecer imediatamente, caso a opção de salvar os dados não for marcada.

Seu email não será publicado. *Campos obrigatórios.

Um Comentário (Deixe o seu!)
  1. Carlos Henrique Fonseca:

    OI, bom dia. Sou Engenheiro de Alimentos e quero parabenizar você pelo trabalho! Estou procurando parceiros possíveis em Ciência de Alimentos. Pensei em ti. Vamos fazer um bate papo no Zoom? Quero conhecer você. Forte abraço